1.4.25

Renascença com Razão, mas Sem Fé

Se um pensador da Renascença é apresentado como filósofo cristão, mas sem ser, quais serão as consequências aos católicos, por exemplo, que entrarem em contato com o seu trabalho, direta ou indiretamente, buscando razões em defesa da fé? Simples: enganar-se-ão. Entenda a situação na sequência.
Sandro Botticelli. Primavera.
1. Marsílio Ficino (1433-1499), valendo-se de um (neo)platonismo por ele empreendido, coaduna elementos próprios do cristianismo — desconhecidos ou ignorados pelos pretensos filósofos da atualidade, pelo visto — com uma quantidade insensata de elementos de um hermetismo que ele acreditava ser “compatível”, senão a causa da fé.

2. Ao certo, as concepções que ele coadunou nesta perspectiva são provenientes do contato que ele teve com pensamentos herméticos ao traduzir escritos desta natureza, como obteve desde logo pela tradução de Poimandres, tratado inicial do Corpus Hermeticum, atribuído ao lendário Hermes Trismegisto.

3. Verdade que em seu argumento há indicações de existir apenas um Deus, como se vê pela fé, porém, sendo “compatível” com uma divindade hermética não revelada, também atingível através do que se firma como magia. Ora! Tal é o tema em um livro: Ficino ajudou a paganizar o continente europeu? Observe como isso se fixa em termos simples.

4. Admitindo-se tacitamente as tentativas de paganização do continente europeu, livraram as obras de Ficino dessa contribuição, o que é patente, admitindo sua filosofia como cristã, talvez melhor que São Tomás de Aquino, embora isso seja somente um arremate curioso, porém, pouco claro, de um dado da obra de Étienne Gilson (1884-1987).

5. Só um adendo: São Tomás de Aquino é santo e doutor da Igreja Católica. Então, o que não é atingido no trabalho é a compreensão acerca das decorrências do pensamento de Ficino para afirmar se ele foi de fato um filósofo cristão ou se, embora católico, perdeu-se no empreendimento abestalhado de “compatibilizar” cristianismo e hermetismo.

6. Em “Fé e Razão na Renascença”, Talyta Carvalho conclui que Ficino foi filósofo cristão, o que não é seguro, muito menos verídico do ponto de vista da fé. Talvez o fosse, mas tão somente em um sistema “compatibilizado”, no qual os pensamentos herméticos pudessem ser contemplados, mas que jamais podem ser vinculados ao cristianismo.

7. Na verdade, foi o que ele fez. Valeu-se do (neo)platonismo para “compatibilizar” hermetismo e cristianismo com aquilo que ele realmente mais acreditava: magia. Afinal de contas, depois é possível constatar nos “Tratados de Filosofia Oculta” de Cornelius Agrippa (1486-1535) as influências dessas crenças de Ficino.

8. Também é notável que Ficino foi humanista inveterado e o motivo pelo qual nunca poderia ter sua filosofia percebida como contributo ao cristianismo, cujas ideias estariam para o atrito causado na madeira assim como aquela magia no meio da vida cristã — e a combustão ao primeiro caso é igual ao segundo, contudo, através do aspecto herético.

9. De toda forma, este Enquirídio se ocupará da exposição do misticismo na qualidade de artifício armado para formação da sociedade anticristã, onde Ficino será, assim como outros, realmente apresentado. Agora, basta saber que nem todos que falam de Deus se referem também a Jesus Cristo. Isso se nota em “Fé e Razão na Renascença”.
    Para referenciar esta postagem:
ROCHA, Pedro. Renascença com Razão, mas Sem Fé. Enquirídio. Maceió, 01 mar. 2025. Disponível em https://www.enquiridio.org/2025/03/de-genio-a-eugenista-ci-07.html.

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